O peixe e o gato

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Começo este artigo transcrevendo dois trechos da Lei Complementar 179, de 24/2/21, que instituiu a autonomia do Banco Central:

“Art. 1º O Banco Central do Brasil tem por objetivo fundamental assegurar a estabilidade de preços.

Parágrafo único. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental, o Banco Central do Brasil também tem por objetivos zelar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego”

A regra é clara, ou, como diz o provérbio “um olho no peixe e outro no gato”. Ao assegurar a estabilidade de preços, o Banco Central precisa, também, considerar a atividade econômica e o emprego.

O legislador foi hábil, pois, se fosse só para segurar a inflação, bastaria jogar as taxas de juros na lua e colocar o país na recessão.

A definição do nível das taxas de juros não é um assunto puramente matemático, pois também considera questões como expectativas, riscos, comportamentos, etc. E os bancos centrais tendem a ser conservadores.

No Brasil, o Banco Central, tudo indica, exagerou quando reduziu as taxas de juros para 2% a.a. em 2021, olhando mais para a atividade econômica e emprego no pós covid-19 (dovish) e menos para a inflação e foi obrigado a subir demasiadamente as taxas para 13,75% a.a. em 2022 (hawkish), olhando mais para a inflação do que para a economia. Parece ter faltado um meio termo em ambos os casos.

Este dilema não é exclusividade nossa. Em que pese recente aumento nos juros na Europa, os bancos centrais no mundo estão dispostos a olhar o peixe e o gato, ou seja, segurar a inflação, mas sem desconsiderar os efeitos da elevação das taxas de juros sobre a economia.

Os sinais para a redução das taxas de juros no Brasil, já presentes no último trimestre de 2022, estão mais claros agora com a divulgação de nova proposta de arcabouço fiscal.

 

Roberto Figueiredo Guimarães

Diretor da ABDIB e ex-Secretário do Tesouro Nacional