Com restrições, execução do orçamento da Infraestrutura é a mais baixa em três anos

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Nos seis primeiros meses de 2019, o Ministério da Infraestrutura registrou o menor nível de gastos com investimentos dos últimos três anos, com valores executados 10% abaixo do mesmo período do ano de 2018.

Com o mais baixo orçamento aprovado da década, o nível de empenhos (que são as garantias dadas pelo governo de pagamento futuro por serviços prestados) também afundou, registrando valor 20% abaixo do primeiro semestre de 2018 e semelhante ao pior ano da década, o de 2016.

Também caíram ao mais baixo nível os investimentos das estatais do setor de infraestrutura, que no primeiro semestre de 2019 foram metade do valor despendido no mesmo período de 2018, que era então o pior ano em gastos.

Os valores da execução orçamentária do ministério constam do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira) e foram pesquisados pela Agência iNFRA. Eles mostram um quadro grave de redução dos gastos em desenvolvimento de infraestrutura que afetam setores vitais da economia do país, como rodovias, ferrovias e portos.

Em nota (cujo inteiro teor está abaixo), o Ministério da Infraestrutura informou que os valores aprovados para execução estão caindo, que sofre restrições orçamentárias impostas pela lei e que tem expectativa de que os valores melhorem no segundo semestre.

O quadro grave de gastos do setor no governo federal tem um número que pode ser olhado pelo lado positivo. Comparando o que o ministério executou em 2019 com o que foi empenhado, o percentual está em 24%. É o maior da década (o índice já foi de 7%), o que mostra mais velocidade para fazer o que está aprovado.

Outro dado é que a Valec, estatal dependente que constrói ferrovias, praticamente triplicou o volume gasto em relação a 2018. Isso ajuda nos investimentos, mas tem pouca relevância para a melhoria do transporte, já que ela está gastando em obras que ainda demoram a entrar em funcionamento, o que só ocorrerá após a concessão.

Nas outras estatais não dependentes – a Infraero e as autoridades portuárias – o gasto com investimentos foi de apenas R$ 112 milhões nos primeiros seis meses. Isso é quase metade do ano passado e apenas 10% do valor de 2014, por exemplo. Esse ano, contudo, foi um ano atípico, pois a Infraero estava com investimentos elevados por causa de obras da Copa em unidades hoje concessionadas.

Rodovias

Onde o problema é mais grave, nas obras de rodovias, que consomem mais de 85% dos recursos de investimentos do ministério, os volumes de empenho, execução e pagamento caíram. No caso do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), o volume de investimentos do órgão é o menor em três anos, com queda próxima a 20% em relação ao ano passado.

Em valores corrigidos, o melhor primeiro semestre de execução do ministério na década foi o de 2011, com R$ 1,853 bilhão executados nos seis primeiros meses do ano. Nestes seis meses passados, o volume está em R$ 1,252 bilhão.

O menor volume de gastos é agravado por um fator que não depende da atuação do órgão, que é o preço do CAP (Cimento Asfáltico de Petróleo). É o principal item de custo para obras rodoviárias, chegando a significar mais de 40% em alguns contratos.

Entre 2011 e 2015, o valor ficou praticamente congelado, com a Petrobras – monopolista do setor – vendendo a preços abaixo do mercado internacional, em alguns períodos com prejuízo. Com a mudança na postura da empresa, deu-se o contrário.

Aumento de preços

Estudo da CNT (Confederação Nacional do Transporte) apontou que o CAP (Cimento Asfáltico de Petróleo) vendido no Brasil não tem garantia de qualidade, devido a regras defasadas de controle e falta de fiscalização. Além disso, o monopólio da Petrobras faz com que o preço esteja descolado do mercado internacional, elevando custos para governos em todo o país.

O trabalho, disponível neste link, aponta que a Petrobras vem reduzindo o número de refinarias que produzem o produto. Como só a Petrobras vende, a empresa descolou os preços do valor do barril de petróleo. Até setembro de 2018, os reajustes seguiram o aumento dos preços do petróleo. A partir daquele mês, o valor do petróleo caiu 22% e o do asfalto subiu 27%. O aumento total em três anos é de 108%.

O impacto é direto e significa, na prática, menos obras feitas, se considerado o mesmo gasto de anos em que o preço ficou sem alterações. E isso tem consequências no bolso de cada um.

Estudo também da CNT, publicado em sua pesquisa anual de rodovias, mostra que quanto pior a qualidade do piso, mais custos têm as empresas e autônomos para transportar.

Considerando uma rodovia em estado ótimo com um custo específico, uma rodovia em estado bom eleva esse custo em 19% se comparado com a de estado ótimo. Se a rodovia é classificada como ruim, esse custo sobe a 66%, e nas péssimas, a 92%.

Na pesquisa de 2018, o custo para transportar no Brasil era, na média, 27% maior por causa da condição das estradas. Como as estradas sob gestão de governo são piores que as concedidas, nelas a média vai a 31%.

Ministério diz que contingenciamentos impedem maiores execuções

Em resposta a questionamentos da Agência iNFRA, o Ministério da Infraestrutura encaminhou uma nota em que lembra da “contínua redução, nos últimos anos, dos valores autorizados na Lei Orçamentária Anual para os investimentos a cargo desta Pasta, fato que, por si só, já explica a principal diferença entre o nível atual da execução orçamentária e financeira e os dados da série histórica”.

O texto lembra que “o desempenho orçamentário e financeiro está sujeito às restrições impostas pelo Decreto de programação orçamentária e financeira que estabelece limites para movimentação e empenho e pagamento cujos números, em regra, atingem patamar abaixo do montante demandado”.

Sobre o orçamento de 2019, a pasta lembra que o contingenciamento do início do ano restringiu em torno de 40% a execução da dotação primária discricionária consignada na LOA/2019.

“Tal situação comprometeu o ritmo de execução de determinadas programações. Em que pese o abrandamento do contingenciamento, no mês de maio, quando da obtenção da expansão de limite de empenho no valor de R$ 2 bilhões, convém esclarecer que ainda não houve tempo hábil suficiente para que os efeitos da mencionada expansão fossem totalmente propagados”, informa o texto lembrando que  o limite de empenho autorizado é de 78,5 % da LOA.

“A expectativa é que no segundo semestre os investimentos desta Pasta tenham ritmo de execução mais intenso, desde que assegurados os limites orçamentários e financeiros imprescindíveis ao cumprimento integral das ações planejadas para o ano em curso.”

Apagão das estradas vai se configurando inevitável

Apesar do esforço do governo em concentrar recursos em obras que estão para serem finalizadas e dos pedidos para que os parlamentares direcionem suas emendas orçamentárias para projetos que estão em fase mais madura para execução, o quadro orçamentário para 2020 tende a ser ainda mais grave em termos de gastos.

O orçamento de investimentos do ano que vem deve ser ainda menor, já que as despesas obrigatórias tendem a subir, tirando espaço do investimento dentro do limite do Teto de Gastos. E o governo ainda não terá conseguido passar à iniciativa privada nem 10% da extensão de cerca de 13 mil km de rodovias previstas para ser concedidas pela primeira vez.

Em relação às condição das estradas federais, o quadro também não é favorável. O último grande programa de manutenção profunda de rodovias do país ocorreu entre os anos de 2013 e 2014, quando o atual ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, era diretor do DNIT.

A durabilidade desse tipo de conservação é entre 5 a 7 anos, o que faz com que esteja se encerrando o ciclo na maior parte das vias federais. Se nada se modificar, o apagão do transporte vai se configurando inevitável.